"I hope the fences we mended
Fall down beneath their own weight"

John Darnielle

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quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Elogio da derrota



"O futebol é uma chatice. É um pretexto para as pessoas estarem juntas, para os pais e os filhos não terem que enfrentar o grande silêncio." Disse-o ao ‘Público’ Sérgio Oksman, realizador de "O Futebol", que passou há dias no DocLisboa. O filme, esse, é desconcertante: conta a história de um pai e de um filho apartados vai para duas décadas que combinam reencontrar-se no Brasil, para assistir ao Mundial.

Ao longo de 70 minutos, não se vê uma única bola em movimento ou um jogador. A câmara fixa pai e filho a acompanharem jogos em cafés, do lado de fora do estádio e até num hospital. O que conta é a sugestão de que a fragilidade dos laços familiares e dos afetos paternais tem nos jogadores e no jogo formas de aproximação sentimental. O futebol para enfrentar a ausência e o grande silêncio.

Desculpem-me o regresso à derrota do Benfica às mãos do Sporting, mas estive em Alvalade nos 7-1 e sei que não devemos contornar as experiências traumáticas, temos de enfrentá-las. Neste trauma que ainda está bem vivo, a meio do jogo, o meu filho, que nos anos que leva de bancada da Luz nunca havia visto nada assim, disse-me, meio a medo, "não quero estar aqui". Expliquei-lhe que não se abandona as bancadas antes do fim.

É uma questão de princípio e uma experiência formativa. Sem a sensação singular de vivermos as derrotas e de deixarmos que elas se entranhem, não sofreríamos da mesma forma pelo nosso clube. Mais importante, com as vitórias e os abraços emocionados nos golos, está claro, quebramos o silêncio, aproximamo-nos. Já nas derrotas dolorosas, aprendemos a sofrer em conjunto. O que faz muita falta no resto da vida que fica fora dos estádios.

publicado no Record de terça-feira